Como Órgãos Independentes Podem Começar a Exigir Responsabilização da Polícia

Riot police keep watch beneath onlookers on a bridge during a rally in Tijuana, Mexico, on November 22, 2018. © Mario Tama/Getty

Eventos recentes—desde o assassinato de George Floyd e de outros negros nas mãos de policiais americanos até a tortura sistêmica de manifestantes pela polícia na Bielorrússia passando pela morte de pessoas detidas durante os lockdowns da COVID-19 na Índia e no Quênia—demonstram os padrões globais da violência cometida pela polícia.

Atualmente as investigações sobre o uso excessivo da força e a violência policial são mais frequentemente conduzidas pela própria polícia. Demasiadas vezes, quando a polícia investiga a si mesma, não consegue quebrar o "código de silêncio policial". Um tribunal de recursos no Quênia descobriu que o "código de silêncio policial" é um fenômeno comum no mundo inteiro, aplicado nas culturas policiais na América, Europa, Ásia e África. Segundo esta regra não escrita, policiais nunca divulgam informações incriminatórias sobre seus colegas e muitas vezes escondem informações sobre erros cometidos por seus colegas atrás de uma cortina coletiva de autopreservação.

Embora continue sendo a norma em muitos países, a polícia não deve investigar seus próprios colegas, especialmente quando podem ter cometido crimes graves. Investigações criminais eficazes e independentes são fundamentais para responsabilizar a polícia e outros agentes do Estado por crimes graves. Elas também ajudam a aumentar a confiança do público em relação à polícia.

Nossa nova publicação, Quem Policia a Polícia? O Papel dos Órgãos Independentes nas Investigações Criminais de Agentes Governamentais (em inglês), explora exemplos de diferentes países da África, Caribe, América do Sul e do Norte e Europa Oriental e Ocidental, e como estão formando órgãos separados da polícia para apresentar e processar alegações de crimes graves pela polícia ou outros agentes governamentais.

Os órgãos independentes devem ser os principais investigadores sempre que uma pessoa morre ou é gravemente ferida em detenção ou em outro contato com agentes governamentais. Também devem investigar quaisquer alegações de tortura, incluindo agressão psicológica, abuso sexual ou desaparecimento forçado.

Com base em mais de duas dezenas de entrevistas, uma revisão da literatura relevante e a prática de quinze órgãos independentes e promotorias, nossa publicação oferece recomendações para melhorar o nível de independência, aumentar o poder de investigação e de acusação e garantir a transparência entre esses órgãos. 

Independência

A independência é o oxigênio de uma agência de investigação confiável. No entanto, não é fácil garantir a independência em relação à polícia ou das instituições políticas. Mesmo depois de conquistada, a independência pode ser afetada de muitas maneiras. Para serem eficazes, os órgãos precisam de legislação separada, orçamento dedicado apropriado e instalações físicas separadas. O diretor do órgão não deve ser um ex-agente governamental e deve estar livre de pressões externas, particularmente em como esse líder é nomeado e potencialmente demitido.

Por exemplo, constatamos que o Tribunal Constitucional da África do Sul decidiu que o chefe da polícia não pode suspender ou remover o diretor executivo de um órgão de supervisão. No ano passado, a Assembléia Nacional Sul-Africana aprovou legislação que prevê que a única autoridade que pode remover o diretor executivo é o Parlamento Sul-Africano, com uma maioria de dois terços de votos.

Poderes

Os investigadores devem ter os mesmos poderes que os policiais dentro de sua jurisdição e devem ser capazes de investigar a polícia e outros agentes governamentais, incluindo superiores e militares, pelo menos no desempenho de funções policiais.

Por exemplo, descobrimos que em 2019 o Tribunal Penal Federal da Argentina condenou o diretor de uma unidade prisional a seis anos e seis meses de prisão pelo crime de não impedir a aplicação de tortura, além de penas mais severas para outros 14 agentes penitenciários envolvidos.  Além disso, um inspetor regional do serviço penitenciário foi condenado e sentenciado a seis anos de prisão por não ter denunciado o crime.

Os órgãos independentes devem conduzir as ações iniciais de investigação, tais como exames da cena do crime, e ter pessoal treinado e recursos apropriados. Por exemplo, o INDECOM, um órgão independente na Jamaica, comparece a todas as cenas de crime envolvendo qualquer agente do governo, incluindo a polícia, o exército (quando atua em conjunto com a polícia), ou oficiais do sistema correcional. A lei INDECOM autoriza o órgão a se encarregar e preservar a cena de qualquer incidente.

Transparência

É importante que órgãos de investigação independentes comuniquem à vítima, aos agentes e ao público a sua decisão de acusar ou não um agente governamental. Quando as decisões de acusação são exclusivamente dos promotores, deve haver protocolos rigorosos para informar o diretor e permitir que este emita declarações públicas. Em Ontario, o Diretor da Unidade Especial de Investigações é pessoalmente responsável por cada decisão de acusar um agente governamental. Se for decidido não acusar, o diretor emite um comunicado público explicando os fundamentos de sua decisão.

Por último, as investigações criminais por si só não impedirão o abuso por parte da polícia e outros agentes governamentais. Os departamentos policiais também precisam de controles internos contra o uso de força, fortes procedimentos disciplinares, mudança de cultura na polícia e nas forças de segurança. Tanto os promotores quanto os investigadores precisam ser especializados. A sociedade civil desempenha um papel fundamental na identificação de casos de abuso, apoio às vítimas e no fornecimento de provas médicas e outras.

Mesmo os órgãos que funcionam bem são imperfeitos e não são uma panaceia para a violência policial. No entanto, nosso relatório mostra que órgãos de investigação independentes, se estabelecidos adequadamente, podem contribuir para a responsabilização policial, investigações eficazes sobre as ações dos agentes governamentais em relação à direito a julgamento justo, que proporciona maior justiça para as vítimas. 

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